Há uma tendência preocupante que se repete sempre que o mundo treme: muitos países entram em modo de defesa, retraem-se, esperam que a tempestade passe. Mas há um dado que começa a distinguir Portugal. Segundo o mais recente estudo do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais (GPEARI) do Ministério das Finanças, a economia portuguesa mostra uma capacidade de resistência que desafia as expectativas e desmente a narrativa habitual de vulnerabilidade. Quando todos metem a cabeça na areia, Portugal levanta a sua e prova que talento e inovação são as melhores armas contra a incerteza.
O estudo analisou o impacto de choques económicos em três grandes parceiros comerciais de Portugal: Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido. A conclusão é surpreendente. Apesar de os Estados Unidos serem a maior economia mundial e o quarto maior cliente das exportações portuguesas, a sua influência sobre o desempenho nacional é mínima. Um aumento de um milhão de euros no PIB norte-americano traduz-se em apenas 65 euros adicionais nas exportações portuguesas. Já um aumento equivalente no PIB alemão teria um impacto de 2.300 euros e no PIB britânico de 980 euros. À primeira vista, estes números poderiam ser interpretados como sinal de fragilidade. Mas o que o estudo revela é exatamente o contrário: as exportações portuguesas para os Estados Unidos ajustam-se mais rapidamente a qualquer turbulência económica.
Enquanto as vendas para a Alemanha demoram, em média, três trimestres a regressar à normalidade depois de um choque, e as exportações para o Reino Unido levam ainda mais tempo, o mercado norte-americano volta ao equilíbrio em apenas dois trimestres. Isto significa que as relações comerciais de Portugal com os Estados Unidos são mais ágeis, sofisticadas e adaptáveis. Essa rapidez de resposta não se deve à dimensão das trocas, mas à natureza das exportações portuguesas: produtos de maior valor acrescentado, tecnologicamente avançados e com um perfil de procura menos volátil.
Em vez de depender excessivamente de um pequeno grupo de bens tradicionais, Portugal diversificou a sua oferta, apostando em áreas como a engenharia, a biotecnologia, os equipamentos médicos, as tecnologias de informação e os serviços especializados. Essa transformação estrutural tem sido gradual, mas consistente. O Banco de Portugal confirma essa tendência no seu boletim económico de outubro, onde assinala que, entre 2015 e 2024, mais de 60% do ganho de quota de mercado das exportações portuguesas na União Europeia resultou de bens e serviços intensivos em tecnologia e conhecimento.
Durante a última década, as exportações portuguesas cresceram 81,6% na União Europeia, superando as importações em mais de 20 pontos percentuais. Esse desempenho traduziu-se num aumento real da competitividade. Ou seja, Portugal não está a vender mais apenas porque o mercado europeu cresceu, mas porque os seus produtos ganharam relevância e qualidade. Produtos farmacêuticos, componentes eletrónicos, soluções de software e serviços de telecomunicações são hoje parte essencial das exportações nacionais. Este reposicionamento é fruto direto do talento nacional e da aposta em inovação, investigação e desenvolvimento.
Ao contrário do que se pensa, a resiliência não é apenas uma questão de sorte ou de conjuntura favorável. É uma construção coletiva que combina visão estratégica, políticas públicas consistentes e a capacidade das empresas em adaptar-se. A economia portuguesa aprendeu com as crises anteriores, e hoje mostra um padrão de resposta que a distingue de outros países europeus. Quando há uma perturbação externa, o impacto é real, mas o retorno à normalidade é rápido. Esta agilidade explica por que razão, mesmo num ambiente global instável, o país continua a crescer, a exportar e a atrair investimento estrangeiro.
Outro fator importante é o perfil do talento português. As novas gerações estão altamente qualificadas, com formação técnica e científica sólida, e cada vez mais orientadas para setores de valor acrescentado. A combinação entre conhecimento e criatividade faz de Portugal um terreno fértil para inovação. Não é coincidência que várias multinacionais tecnológicas estejam a instalar centros de desenvolvimento no país, nem que startups nacionais estejam a conquistar espaço em mercados internacionais exigentes.
O estudo do GPEARI mostra que o choque económico nos Estados Unidos tem impacto imediato nas exportações de alimentos, bebidas, tabaco e produtos de borracha e plástico, mas que as restantes exportações dependem sobretudo de tendências estruturais de longo prazo. Esta constatação reforça a ideia de que Portugal está menos exposto a oscilações conjunturais e mais ancorado em relações comerciais sustentáveis.
Enquanto outros países europeus ainda lutam para recuperar de abalos económicos recentes, Portugal parece ter encontrado uma fórmula de estabilidade baseada na diversificação e na capacidade de inovar. Não é que o país esteja imune às crises globais, mas sabe responder-lhes com inteligência e flexibilidade. Essa é a essência da verdadeira resiliência.
Portugal não precisa de negar os desafios que enfrenta. Precisa, sim, de continuar a fazer o que tem feito melhor: investir em talento, apostar na inovação e confiar na sua capacidade de competir globalmente. Quando todos se escondem à espera que a tempestade passe, Portugal levanta a cabeça, enfrenta o vento e segue em frente. É assim que se constrói uma economia moderna, confiante e capaz de transformar adversidade em oportunidade.
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